segunda-feira, 9 de março de 2015

Página 60

A cada hora, minuto ou segundo que passava, sentíamos o ar ficar cada vez mais pesado. Começáramos a senti-lo como se ele fora o frio encarnado. Também me incomodava muito um tipo de poeira cinzenta que, mesmo caindo lá fora, deixava o local mais assustador. Assim, víamos cobertos por essa poeira, árvores sem vida, prédios demolidos e em estado deplorável, tudo isso formava o cenário de um local absolutamente deserto. Nosso veículo era apenas seguido pelo veículo da equipe de Maria, mas quase não sentíamos as energias dos tripulantes de apoio. Viajamos por essa paisagem assustadora por algumas horas, até que, como que surgindo do nada, uma grande fortaleza se abriu a nossa frente. Seus muros feitos todos de pedras mediam quase cinco metros de altura e, por trás deles, encontrava-se um grande castelo ou igreja - de longe eu não sabia diferenciar. Espíritos de branco com coletes dourados faziam a vigia em guaritas sobre a muralha. Mas vigiar o quê e por quê, em um local que, ao menos para meu olhar, encontrava-se sem vida e, ainda, o que fazia afinal aquela fortaleza em local tão afastado da crosta terrestre? Essas eram as minhas indagações, que com o tempo seriam respondidas, mesmo sem que eu as verbalizasse. O grande portão de madeira se levantara lentamente e nossos veículos passaram suavemente por ele. O local também não era bonito, ou seja, por trás dos muros a paisagem não mudara, ali continuava frio e escuro e as cinzas caiam como uma fina garoa. O castelo ficava a quase cem metros da muralha, sua escadaria de pedras e um pátio nos davam a impressão de que estávamos em um castelo europeu. Nas escadas, uma pequena comitiva de boas-vindas: três homens e duas mulheres, todos vestidos de calças e batas brancas. Um deles trazia na cintura uma faixa dourada, os outros quatro usavam tais faixas na cor azul claro. Nossos veículos pararam a poucos metros da escada, descemos calmamente e o homem de faixa dourada, um negro alto de sorriso iluminado e olhos escuros como jabuticaba, disse-nos: - Que o manto de Maria cubra a cada um de vocês e que a misericórdia divina esteja com todos nós. Foi João quem respondeu: - Que assim seja, meus amigos. Será que nesse recanto de amor e de paz, iluminado pelo amor do Cristo Jesus, há um lugar para esses pobres fios de Deus descansarem? O homem sorriu gostosamente e respondeu: - João Guiné, seu velho mandingueiro, quando foi que você não encontrou abrigo na casa do pai? Sejam bem-vindos a nossa casa, Mensageiros de Aruanda. Subimos as escadas e fomos recebidos com calorosos abraços por todos. - Meu nome é Frederico, diretor deste local de socorro. Estes são, Augusto, Alexandre, Francisca e Catarina, responsáveis pela estadia de vocês aqui. - Perdoe-me o atrevimento Frederico, mas não há nenhuma placa ou informe do nome da colônia de vocês em nenhum local. Aonde estamos? - perguntou Humberto. - Estão na casa do pai e isso basta, não é mesmo? - Mas por que o anonimato? - insistiu Humberto. Vocês não serão os primeiros ou os últimos a falarem desse local de socorro. Na verdade, desde há muito tempo, médiuns recebem notícias desse local e cada um lhe dá o nome que prefere e isso nos deixa muito felizes. Não precisamos de um rótulo e por isso não o temos. O mais alto acha injusto rotular o último ponto de apoio antes de se adentrar a uma região tão sofrida. Aqui abrigamos todos os viajantes, socorristas, estudiosos e ainda espíritos ignorantes, antes de serem levados a outras cidades espirituais, por isso chamamos este local de colônia e não de cidade. Estamos aqui há muito tempo, abrigando e sendo o farol daqueles que precisam se orientar na escuridão. Frederico apontou para o que eu achara ser uma das torres do local e que, no entanto, era mesmo um farol iluminado, orientando a direção àqueles que iam buscar na escuridão a luz do amor e da verdadeira abnegação ao Pai celestial e, por alguns segundos, debaixo daquela garoa de cinzas, eu fiquei admirando aquela luz prateada, brilhando como uma estrela solitária...



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